Se você estiver usando algum navegador diferente do Internet Explorer talvez alguns links estejam abaixo do menu neoartesanatourbano.blogspot.com: Arte popular e pré-artesanato nordestino

Arte popular e pré-artesanato nordestino

Lina Bo Bardi (1994)


Arte popular é o que mais longe está daquilo que se costuma de chamar Arte pela Arte. Arte popular, neste sentido, é o que mais perto está da necessidade de cada dia, NÃO-ALIENAÇÃO, possibilidade em todos os sentidos. Mas esta não-alienação artística coexiste com a mais baixa condição econômica, com a mais miserável das condições humanas. Assim, não é a apologia da arte popular que cumpre fazer se esta arte, para sobreviver, necessita da conservação do statu-quo, nem tampouco a consolação através da arte em lugar da solução técnica e do planejamento econômico. Precisamos desmistificar imediatamente qualquer romantismo a respeito da arte popular precisamos nos libertar de toda mitologia paternalista, precisamos ver, com frieza crítica e objetividade histórica, dentro do quadro da cultura brasileira, qual o lugar que à arte popular compete, qual sua verdadeira significação, qual o seu aproveitamento fora dos esquemas “românticos” do perigoso folklore popular. Não existe um artesanato brasileiro importante. Não existe um artesanato importante em nenhum oásis do mundo que esteja no estágio de civilização industrial, independentemente do grau de desenvolvimento atingido. A organização social artesanal pertence ao passado, o que temos hoje são sobrevivências naturais em pequena escala, com herança de oficio, ou (e o caso mais conhecido é o da Itália), por determinações artificiais, como exigências turísticas ou a crença difundida, de que o objeto feito a mão é mais prezado do que o “feito à máquina”. Em geral, este tipo de artesanato é responsável por uma produção que poderia se constituir num importante “Museu dos Horrores” internacional; é o caso da Itália de quase toda a Europa excluindo parte da produção Finlandesa. Não existe um artesanato brasileiro, existem produções esporádicas. O Brasil será obrigado a enfrentar o problema da verdadeira industrialização diretamente. As corporações artesanais não entram em sua formação histórica. No Nordeste existe, se queremos continuar a usar a palavra artesanato, um pré-artesanato, sendo a produção nordestina extremamente rudimentar. A estrutura familiar de algumas produções como, por exemplo, as rendeiras do Ceará ou os ceramistas de Pernambuco, podem ter uma aparência artesanal, mas são grupos isolados, ocasionais, obrigados pela miséria a este tipo de trabalho, que desapareceria logo com a necessária elevação das rendas do trabalho rural.
 
Texto cedido pelo Arquivo Instituto Lina Bo e P. M. Bardi, São Paulo, SP (www.institutobardi.com.br) BARDI, Lina Bo. Tempos de Grossura. São Paulo: Instituto Lina Bo e P. M. Bardi, 1994. pp 25-28. Disponível em:http://www.acasa.org.br/ensaio.php?id=166&modo=